MICROCEFALIA E/OU ALTERAÇÕES DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL
SUMÁRIO
- Características gerais
- Outras características
- Tratamento
Características gerais
As
microcefalias, como as demais anomalias congênitas, são definidas como alterações
de estrutura ou função do corpo que estão presentes ao nascimento e são de
origem pré-natal (1).
Segundo a Organização
Mundial da Saúde (OMS) e literatura científica internacional, a microcefalia é
uma anomalia em que o Perímetro Cefálico (PC) é menor que dois (2) ou mais
desvios-padrão (DP) do que a referência para o sexo, a idade ou tempo de
gestação (1–7).
A medida do PC é um dado
clínico fundamental no atendimento pediátrico, pois pode constituir-se na base
do diagnóstico de um grande número de doenças neurológicas e para isso os
médicos e outros profissionais de saúde devem estar familiarizados com as doenças
mais frequentes que produzem a microcefalia e devem conhecer os padrões de
normalidade para o crescimento do crânio (3).
Em 22 de
outubro de 2015, a Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco notificou e
solicitou apoio do Ministério da Saúde para complementar as investigações
iniciais de 26 casos de microcefalia, recebida de diversos serviços de saúde
nas semanas anteriores à notificação. Por se tratar de evento raro e comparando
com o perfil clínico e epidemiológico dessa doença no Estado, concluiu-se que
se tratava de evento de importância para a saúde pública estadual. Desde então,
o Ministério da Saúde apoiou e continua apoiando as investigações em Pernambuco
e nos demais Estados da Região Nordeste, tendo notificado a OMS em 23 de
outubro de 2015, conforme fluxo do Regulamento Sanitário Internacional (RSI) (8).
Naquele momento, uma das
principais hipóteses sob investigação era a infecção pelo vírus Zika,
potencializando a ocorrência de microcefalias e das demais causas conhecidas
como outras infecções virais, exposição a produtos físicos, químicos ou fatores
genéticos.
Em 24 de
novembro de 2015, foi publicada a “Avaliação Rápida de Risco – Microcefalia no
Brasil potencialmente relacionada à epidemia de vírus Zika”, realizada pelo Centro
de Controle de Doenças da União Europeia (ECDC). Neste documento, é relatado
que a Polinésia Francesa notificou um aumento incomum de pelo menos 17 casos de
malformações do Sistema Nervoso Central em fetos e recém-nascidos durante
2014-2015, coincidindo com o Surto de Zika vírus nas ilhas da Polinésia
Francesa.
Nenhuma das gestantes relataram sinais de infecção pelo vírus Zika,
mas em quatro testadas foram encontrados anticorpos (IgG) para flavivírus em
sorologia, sugerindo infecção assintomática. Do mesmo modo que no Brasil, as
autoridades de saúde da Polinésia Francesa também acreditam que o vírus Zika
pode estar associado às anomalias congênitas, caso as gestantes estivessem infectadas
durante o primeiro ou segundo trimestre de gestação (9).
Em 28 de
novembro de 2015, com base nos resultados preliminares das investigações
clínicas, epidemiológicas e laboratoriais, além da identificação do vírus em
líquido amniótico de duas gestantes da Paraíba com histórico de doença
exantemática durante a gestação e fetos com microcefalia, e da identificação de
vírus Zika em tecido de recém-nascido com microcefalia que evoluiu para óbito
no estado do Ceará, o Ministério da Saúde reconheceu a relação entre o aumento
na prevalência de microcefalias no Brasil com a infecção pelo vírus Zika
durante a gestação (8,10). No dia seguinte, 29 de
outubro, mudou a classificação desse evento, no âmbito do RSI, para potencial
Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (ESPII) (8).
As
malformações congênitas, dentre elas a microcefalia, têm etiologia complexa e
multifatorial, envolvendo fatores genéticos e ambientais; algumas das causas
mais comuns estão descritas na Tabela 2.
A
identificação da microcefalia se dá principalmente pela medição do Perímetro
Cefálico (PC), procedimento comum no acompanhamento clínico do recém-nascido,
visando à identificação de doenças neurológicas (2).
A medição
do perímetro cefálico é feita com fita métrica não-extensível, na altura das
arcadas supraorbitárias, anteriormente, e da maior proeminência do osso
occipital, posteriormente. Os valores obtidos devem ser registrados em gráficos
de crescimento craniano, o que permite a construção da curva de cada criança e
a comparação com os valores de referência. Mudanças súbitas no padrão de
crescimento e valores anormalmente pequenos para a idade e o peso (menor que
dois desvios-padrão) devem ser investigados. A medida do PC é importante nos
primeiros dois anos de vida, refletindo, até certo ponto, o crescimento
cerebral (2).
Tabela 2. Etiologias
mais comuns para ocorrência de microcefalia (congênita e pós-parto)
CONGÊNITA
|
PÓS-PARTO
|
Genética
|
Genética
|
Adquirida
|
Adquirida
|
Traumas disruptivos
Acidente Vascular
Cerebral hemorrágico
|
Traumas
disruptivos (como AVC);
Lesão traumática no cérebro
|
Infecções
Sífilis
Toxoplasmose
Rubéola
Citomegalovírus
Herpes
simples
HIV
Outros
vírus
|
Infecções
Meningites
Encefalites
Encefalopatia
congênita pelo HIV
|
Teratógeno
Álcool
Radiação
Diabetes materna mal
controlada
|
Toxinas
Intoxicação por cobre
Falência renal crônica
|
Fonte:
adaptado de Practice parameter: Evaluation of the child
with microcephaly (an evidence-based review): report of the Quality Standards
Subcommittee of the American Academy of Neurology and the Practice Committee
of the Child Neurology Society. Neurology [Internet]. 2009 Sep 15 [cited 2015
Dec 6];73(11):887–97. Disponível em: http://www.pubmedcentral.nih.gov/articlerender.fcgi?artid=2744281&tool=pmcentrez&rendertype=abstract
|
A
microcefalia relacionada ao vírus Zika é uma doença nova que está sendo
descrita pela primeira vez na história e com base no surto que está ocorrendo
no Brasil (10). No entanto, caracteriza-se
pela ocorrência de microcefalia com ou sem outras alterações no Sistema Nervoso
Central (SNC) em crianças cuja mãe tenha histórico de infecção pelo vírus Zika
na gestação.
Apesar de
o período embrionário ser considerado o de maior risco para múltiplas
complicações decorrentes de processo infeccioso, sabe-se que o sistema nervoso
central permanece suscetível a complicações durante toda a gestação (Figura 1).
Assim, o perfil de gravidade das complicações da infecção pelo vírus Zika na
gestação dependerá de um conjunto de fatores, tais como: estágio de
desenvolvimento do concepto, relação dose-resposta, genótipo materno-fetal e
mecanismo patogênico específico de cada agente etiológico.
Figura 1 – Período de
formação de órgãos e sistemas durante a gestação
Fonte: Manual de Obstetrícia
de Williams - Complicações na Gestação - 23ª Ed. (2014)
A
microcefalia não é uma doença transmissível. Sua ocorrência está relacionada à
exposição a fatores biológicos, químicos, físicos e genéticos (1,3,6).
Outras características
A
microcefalia é um evento raro. Segundo Ashwal e colaboradores, se considerarmos
que o perímetro cefálico seja normalmente distribuído, significa que 2,3% das
crianças poderiam ser classificadas como microcefálicas. No entanto,
estimativas publicadas para perímetro cefálico menor que dois (2)
desvios-padrão ao nascimento são muito baixos, entre 0,54-0,56%. A diferença
pode ser explicada por uma distribuição não-normal, desenvolvimento pós-natal
de microcefalia, ou averiguação incompleta (5–7). Os casos graves de
microcefalia podem ser esperados em 0,1% das crianças e 0,14% dos neonatos,
assumindo distribuição normal (7).
A
microcefalia pode ser acompanhada de epilepsia, paralisia cerebral, retardo no
desenvolvimento no desenvolvimento cognitivo, motor e fala, além de problemas
de visão e audição (7).
Tratamento
Não há
tratamento específico para a microcefalia. Existem ações de suporte que podem
auxiliar no desenvolvimento do bebê e da criança, e este acompanhamento é
preconizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Como cada criança desenvolve
complicações diferentes entre elas respiratórias, neurológicas e motoras, o
acompanhamento por diferentes especialistas vai dependerdas funções que ficarem
comprometidas.
Estão
disponíveis serviços de atenção básica, serviços especializados de
reabilitação, serviços de exame e
diagnóstico e serviços hospitalares, além de órteses e próteses aos casos em
que se aplicar.
Com o
aumento de casos no ano de 2015, o Ministério da Saúde elaborou o “Protocolo de atenção e resposta à
ocorrência de microcefalia relacionada à infecção pelo vírus zika”, em
parceria com as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, um protocolo de atendimento
voltado a essas crianças. Este protocolo vai servir como base de orientação aos
gestores locais para que possam identificar e estabelecer os serviços de saúde
de referência no tratamento dos pacientes, além de determinar o fluxo de
atendimento.
SINASC
SINASC
Referências
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3. Peñas
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macrocefalia. Pediatr Integr.
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